Apropriação do Espaço com o Corpo
FLÂNEUR
"Ao esteta e ao dândi, na figura de Baudelaire, junta-se o flâneur, que é aquele que flana, ou vive a deambular, caminhar sem rumo pela cidade. Isso é importante: o flâneur não está indo a lugar algum, ele está de passagem [...]". Esse trecho da introdução de Dirceu Villa ao Pequenos Poemas em Prosa, de Baudelaire, traz uma definição um tanto quanto elucidativa sobre o termo em questão. Ainda neste mesmo livro, mas nas palavras de Baudelaire, encontramos uma descrição poética do ato de flanar:
"O andarilho solitário e pensativo tira uma embriaguez singular desta universal comunhão. Quem desposa facilmente a massa conhece gozos febris, dos quais serão eternamente privados o egoísta, trancado como um cofre, e o preguiçoso, internado como um molusco. Ele adota como suas todas as profissões, todas as alegrias e todas as misérias que a circunstância lhe apresenta".
Essa figura característica de meados do século XIX - que surge paralela à urbanização intensa e à multidão - pode parecer estranha a um observador de nosso século. O ato de deslocar-se sem um destino claro, de deixar-se levar pelos convites sutis das ruas e das massas conflitam com o homem produtivo e finalístico tão característicos de nossa época. Além disso, o medo crescente e a sensação de insegurança inibem essa prática, digamos, informal, programática e subversiva de se apropriar da cidade.
DERIVA
Teoria elaborada e divulgada através da Internacional Situacionista em meados do séc. XX, propõe a decifração ou descobrimento do espaço urbano pela experiência direta, através de uma "técnica" baseada em andar sem rumo certo. A teoria se utiliza da psicogeografia - estudo da interação entre o homem e o ambiente - para avaliar os efeitos do meio ambiente sobre o comportamento afetivo e os sistemas perceptivo/cognitivo dos indivíduos. Para tanto, há uma coleta de dados (imagens, sons, vídeos, anotações, rotas) e sua sistematização com a finalidade de desenvolver uma nova forma de análise do espaço urbano. Ainda que esse "estranhamento" proposto se assemelhe à condição do turista, a deriva propõe um "comportamento lúdico-construtivo", não típico do viajante ou transeunte.
Essa prática/teoria assemelha-se muito ao flâneur em princípio, mas tem uma carga política, transformadora, que extrapola o caráter quase estético deste último.
PARKOUR
O parkour é uma prática desenvolvida e sistematizada, até onde se sabe, durante a década de 80-90 que visa a transposição de obstáculos da forma mais efetiva possível, contando para isto com a consciência e constante desenvolvimento corporal. Alguns praticantes enfatizam o fator psicológico dessa exploração de obstáculos.
Esse tipo de apropriação do espaço, por basear-se no desempenho-agilidade, é caracterizado por uma abordagem ativa e dinâmica, algo que altera a própria percepção de espaço dos praticantes. Isto porque em nosso cotidiano existe uma certa submissão aos caminhos preestabelecidos e uma certa indiferença em relação à virtualidade das construções - como a prática deixa entrever, empenas tornam-se espelhos de escadas gigantes; muros tornam-se plataformas de salto; corrimãos tornam-se bases de acrobacias (...)
ROLEZINHOS
Os rolezinhos são encontros que reúnem centenas ou milhares de jovens em espaços públicos ou, como foi e é mais comum, em shoppings center. Sem uma finalidade específica, eles reúnem jovens que se expressam das mais variadas formas, seja ouvindo suas músicas em alto e bom som, seja simplesmente andando e espiando algumas vitrines. Esses encontros são "orquestrados" via redes sociais e tiveram sua origem mais provável como uma espécie de manifestação de funkeiros contra o projeto de lei que buscava vetar os bailes nas ruas paulistanas. Estes encontros, simples a priori, tiveram uma repercussão gigantesca por evidenciarem de forma mais crua o que alguns estudiosos chamaram de um apartheid social. Ainda que houvesse a justificativa dos delitos cometidos por alguns participantes, o movimento contrário a esses encontros por parte das administrações dos shoppings deixou nítido que o incômodo, na verdade, era vinculado muito mais à classe, à cor, e ao fato de a maioria dos 'rolezeiros' provirem das periferias.
A simples presença e o ir e vir de algumas pessoas, neste caso, põe em crise e problematiza nossos conceitos corriqueiros do que é público e do que é privado.
FLASHMOBS
Os flashmobs são aglomerações momentâneas de um grupo (que pode envolver até mesmo milhares de pessoas) que visa realizar alguma ação inusitada. Os encontros são organizados previamente, normalmente via redes sociais, e cada qual tem sua forma de participação definida. Dança, artes plásticas, projeções e vários outros artifícios são usados neste tipo de apropriação. O encontro e a dispersão rápida são uma característica marcante, e são também um dos elementos centrais para que haja um maior impacto e estranhamento do público (todos naquele espaço se tornam público). A apropriação e modificação dos flashmobs por shows de tv com intuito puramente comercial pode, como tem se percebido, descaracterizar ou enfraquecer o potencial desse tipo de ação.
SKATEBOARDING
O skateboarding pode ser lido como um "surf no asfalto". O skatista, munido do seu próprio corpo e do seu skate, apropria-se do espaço urbano tanto para sua simples locomoção quanto para realizar manobras. Esse tipo de apropriação, assim como o Parkour, virtualiza espaços e equipamentos urbanos, como escadas, corrimãos e todo tipo de irregularidade, mostrando seu potencial subversivo ao negar as obviedades oferecidas pelos projetistas.
"Ao esteta e ao dândi, na figura de Baudelaire, junta-se o flâneur, que é aquele que flana, ou vive a deambular, caminhar sem rumo pela cidade. Isso é importante: o flâneur não está indo a lugar algum, ele está de passagem [...]". Esse trecho da introdução de Dirceu Villa ao Pequenos Poemas em Prosa, de Baudelaire, traz uma definição um tanto quanto elucidativa sobre o termo em questão. Ainda neste mesmo livro, mas nas palavras de Baudelaire, encontramos uma descrição poética do ato de flanar:
"O andarilho solitário e pensativo tira uma embriaguez singular desta universal comunhão. Quem desposa facilmente a massa conhece gozos febris, dos quais serão eternamente privados o egoísta, trancado como um cofre, e o preguiçoso, internado como um molusco. Ele adota como suas todas as profissões, todas as alegrias e todas as misérias que a circunstância lhe apresenta".
Essa figura característica de meados do século XIX - que surge paralela à urbanização intensa e à multidão - pode parecer estranha a um observador de nosso século. O ato de deslocar-se sem um destino claro, de deixar-se levar pelos convites sutis das ruas e das massas conflitam com o homem produtivo e finalístico tão característicos de nossa época. Além disso, o medo crescente e a sensação de insegurança inibem essa prática, digamos, informal, programática e subversiva de se apropriar da cidade.
DERIVA
Teoria elaborada e divulgada através da Internacional Situacionista em meados do séc. XX, propõe a decifração ou descobrimento do espaço urbano pela experiência direta, através de uma "técnica" baseada em andar sem rumo certo. A teoria se utiliza da psicogeografia - estudo da interação entre o homem e o ambiente - para avaliar os efeitos do meio ambiente sobre o comportamento afetivo e os sistemas perceptivo/cognitivo dos indivíduos. Para tanto, há uma coleta de dados (imagens, sons, vídeos, anotações, rotas) e sua sistematização com a finalidade de desenvolver uma nova forma de análise do espaço urbano. Ainda que esse "estranhamento" proposto se assemelhe à condição do turista, a deriva propõe um "comportamento lúdico-construtivo", não típico do viajante ou transeunte.
Essa prática/teoria assemelha-se muito ao flâneur em princípio, mas tem uma carga política, transformadora, que extrapola o caráter quase estético deste último.
PARKOUR
O parkour é uma prática desenvolvida e sistematizada, até onde se sabe, durante a década de 80-90 que visa a transposição de obstáculos da forma mais efetiva possível, contando para isto com a consciência e constante desenvolvimento corporal. Alguns praticantes enfatizam o fator psicológico dessa exploração de obstáculos.
Esse tipo de apropriação do espaço, por basear-se no desempenho-agilidade, é caracterizado por uma abordagem ativa e dinâmica, algo que altera a própria percepção de espaço dos praticantes. Isto porque em nosso cotidiano existe uma certa submissão aos caminhos preestabelecidos e uma certa indiferença em relação à virtualidade das construções - como a prática deixa entrever, empenas tornam-se espelhos de escadas gigantes; muros tornam-se plataformas de salto; corrimãos tornam-se bases de acrobacias (...)
ROLEZINHOS
Os rolezinhos são encontros que reúnem centenas ou milhares de jovens em espaços públicos ou, como foi e é mais comum, em shoppings center. Sem uma finalidade específica, eles reúnem jovens que se expressam das mais variadas formas, seja ouvindo suas músicas em alto e bom som, seja simplesmente andando e espiando algumas vitrines. Esses encontros são "orquestrados" via redes sociais e tiveram sua origem mais provável como uma espécie de manifestação de funkeiros contra o projeto de lei que buscava vetar os bailes nas ruas paulistanas. Estes encontros, simples a priori, tiveram uma repercussão gigantesca por evidenciarem de forma mais crua o que alguns estudiosos chamaram de um apartheid social. Ainda que houvesse a justificativa dos delitos cometidos por alguns participantes, o movimento contrário a esses encontros por parte das administrações dos shoppings deixou nítido que o incômodo, na verdade, era vinculado muito mais à classe, à cor, e ao fato de a maioria dos 'rolezeiros' provirem das periferias.
A simples presença e o ir e vir de algumas pessoas, neste caso, põe em crise e problematiza nossos conceitos corriqueiros do que é público e do que é privado.
FLASHMOBS
Os flashmobs são aglomerações momentâneas de um grupo (que pode envolver até mesmo milhares de pessoas) que visa realizar alguma ação inusitada. Os encontros são organizados previamente, normalmente via redes sociais, e cada qual tem sua forma de participação definida. Dança, artes plásticas, projeções e vários outros artifícios são usados neste tipo de apropriação. O encontro e a dispersão rápida são uma característica marcante, e são também um dos elementos centrais para que haja um maior impacto e estranhamento do público (todos naquele espaço se tornam público). A apropriação e modificação dos flashmobs por shows de tv com intuito puramente comercial pode, como tem se percebido, descaracterizar ou enfraquecer o potencial desse tipo de ação.
SKATEBOARDING
O skateboarding pode ser lido como um "surf no asfalto". O skatista, munido do seu próprio corpo e do seu skate, apropria-se do espaço urbano tanto para sua simples locomoção quanto para realizar manobras. Esse tipo de apropriação, assim como o Parkour, virtualiza espaços e equipamentos urbanos, como escadas, corrimãos e todo tipo de irregularidade, mostrando seu potencial subversivo ao negar as obviedades oferecidas pelos projetistas.
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